O luto que poucos entendem
Em 2016 perdi um bebê. A médica falou, rispidamente, pra eu parar de chorar, como não consegui e lamentei por que teria que dar a notícia pras minhas filhas, ela tentou me consolar dizendo que o cachorrinho da filha dela morreu, e ela pensava que a filha fosse sofrer, mas a menina estava bem. Então, era pra eu parar de chorar por que minhas filhas nem iam sofrer muito.
Protagonismo feminino durante a gravidez vai além de escolher a via de parto. É ter consciência de direitos e informação para ter suporte na hora de fazer escolhas difíceis, como quando a gestação é interrompida, bem como identificar e parar manifestações de abuso e violência, sejam elas verbais ou não verbais.
Há muitas variáveis quando se fala em luto perinatal. A história dos pais, se a gravidez foi rejeitada, desejada, planejada ou surpresa, o repertório emocional da mãe, a maturidade do relacionamento que gerou a gravidez e o ambiente, ah... O ambiente, essa rede social que compreende os amigos, parentes, e claro, as equipes médicas que atendem a mãe abortada. Sim, uma mãe também é abortada quando sofre um aborto.
A negligência no luto perinatal, seja por óbito fetal, aborto espontâneo ou natimorto é uma violência obstétrica muito cruel. O fato do bebê ainda não ter nascido, nos dois primeiros casos, faz parecer que ele não existiu de fato, e a sociedade subestima o luto materno alegando que os pais nem tiveram de fato a criança.
Acontece que, a gravidez faz parte de um ajustamento psicológico interno, principalmente da mãe, que adquire a consciência de que há, no mínimo, impulsos de vida se desenvolvendo dentro de si. O afeto e projeções de amor direcionadas a esse novo ser, são reais. Quem já passou por isso sabe o quanto ouviu de consolos e conselhos inúteis. O quanto o luto foi desrespeitado e sentimentos como culpa, raiva, frustração e medo ficaram em evidência durante um longo período.
Não trabalhar o luto perinatal de uma forma saudável, tende a gerar mulheres fragilizadas emocionalmente, medo de nova gravidez ou projeção, em próximas gravidezes, do vazio que a gravidez interrompida deixou, dentre muitas outras consequências negativas para todos os envolvidos.
Comentários
Postar um comentário